Não sou a melhor pessoa para falar sobre o Martin Silva goleiro. Sempre achei a avaliação da torcida generosa demais com ele. Goleiro de muitos méritos sim, mas de falhas conhecidas como nas bolas aéreas e nos chutes baixos. Sobre o Martin Silva ser humano, porém, não há o que questionar. Homem de caráter reto, pessoa de respeito intrínseco ao que significa esse clube. Em um momento em que o Vasco era chutado de todas as formas no cenário nacional, Martin esteve firme e se tornou o parâmetro de como agir com a torcida. Se havia dúvida sobre a maneira correta de um jogador proceder, bastava pensar sobre como o Martin Silva agiria na mesma situação e a dúvida estava desfeita.
Único jogador do Vasco com prestígio internacional, único jogador atual no painel do clube. Martin não chegou lá através de títulos, mas através do carinho. Se alguns gigantes foram para o pôster por elevar o nome do Vasco, Martin foi lá por sustentar esse nome. Se alguns agigantaram, Martin impediu o apequenamento. Como se tornar ídolo disputando duas vezes a série B em cinco anos? Martin mostrou a receita
A questão é que o Martin vem de duas temporadas muito ruins. Se em 2017 o goleiro deixou de salvar o Vasco, em 2018 ele passou a comprometer. O respeito da torcida com ele é tão grande que as críticas demoraram a vir. Houve um excesso de zelo, um medo de machucar o ídolo, de ser ingrato. O balde transbordou no jogo contra o Grêmio. Bola no último minuto, frango decisivo, ponto que poderia ser determinante para o caos. Era quase unânime, Martin deveria ser barrado
Não acredito que a relação entre Martin e Valentim seja problemática a ponto de impedir a continuidade. A não ser que existam coisas que não saibamos, a barração não justifica uma bronca do Martin com o treinador, até porque aconteceu de maneira correta. Fernando Miguel vinha melhor e merecia a vaga. Mostrou em campo com grandes defesas nos últimos jogos.
O problema do Martin não me parece com o Valentim mas com o Vasco. O Vasco deixa a entender que não aposta mais no goleiro. Em um momento de baixa, em que o Martin queria um carinho do clube, uma declaração sobre a importância da sua permanência, um acalanto em um momento difícil, o Vasco mostrou frieza. Como um namorado que apenas gostaria de ouvir do seu amor: vamos continuar, nossa relação não acabou, se o momento não tá bom, vamos juntos construir algo melhor no futuro. É estranho em um mundo de puro comércio que se tornou o futebol esse tipo de relação, mas o Martin é um caso a parte. Deixou isso claro em todos os anos que está no clube.
Eu entendo quem ache que o Martin não deva continuar. Goleiro caro, em dois anos de queda. Seria isso um momento ruim um viés de fim de carreira? Se for um viés, vale a pena, em um clube com a penúria financeira do Vasco seguir nessa aposta ou o melhor seria investir em outra posição?
A dúvida é justa, mas não há garantia da resposta. Martin tem 35 anos de idade, é um cara que se cuida, se preserva. É perfeitamente possível acreditar em uma recuperação e por toda a relação vivida não seria justo dar ao Martin o benefício da dúvida? Não seria a hora do Vasco segurar a bronca da dificuldade e mostrar que está pronto para ser grato quanto aos anos em que o goleiro fez o contrário por nós? Claro que isso não significa dar a ele uma garantia de titularidade, mas sim oferecer uma garantia de confiança, uma garantia de que o clube fará de tudo para que os bons anos retornem. Um cafuné em uma pessoa querida em um momento difícil.
Depois de anos respeitando o Vasco, mais do que vendo valores financeiros, Martin está vendo um clube que vê valores financeiros acima do respeito ao jogador. Acredito que essa seja a mágoa do Martin, não é uma questão com o Valentim, que acaba sendo o bode expiatório para todos os problemas devido ao desempenho ruim que teve até agora no comando do clube. A questão passa acima disso.
Não acredito que o Martin queira ir. Ele quer é receber um carinho, ele quer é receber um afago. Ele quer é que o Vasco o diga para ficar, que não abre mão dele, ele quer uma retribuição.
Qualquer posição que seja a tomada, é preciso prevalecer o respeito. Reconhecer um jogador não é colocar uma foto em um painel. Isso é marketing. Reconhecer um jogador é tratar de maneira franca, honesta. Não quer ficar com o Martin? Que seja dito de maneira transparente. Quer ficar? Então que se dê um passo em direção ao goleiro e devolva e ele um pouco do que ele nos deu nesses cinco anos: o respeito humano acima de tudo.